domingo, 21 de fevereiro de 2016

"XÓGUM – A GLORIOSA SAGA DO JAPÃO" (James Clavell)

~Por Alvaro ~

Antes de começar a falar da pequena enciclopédia sobre o modo de vida japonês do século XVII, que fez esse desbravador atual dos costumes antigos a se apaixonar pelo Oriente como um todo, é necessário dizer que, ler um ou dois livros a respeito do Japão feudal, não me fez virar nenhum expert da história medieval japonesa, mas ao ler livros como “Os Japoneses”, “Ponte de Outono”, o próprio “Xogum – a Gloriosa Saga do Japão”, é possível que a história Ocidental, tão disseminada nas escolas, cursinhos pré-vestibulares e até faculdades, acabe tendo sua história igualada, junto com a aura especial que ronda a maioria dos acontecimentos históricos Ocidentais, ou ainda, que essa aura acabe sendo despertada e penda para o lado Oriental do globo.

Dito isso... Essa resenha vai ser dividida em três partes: A sociedade japonesa no século XVII – período que se passa o livro; a trama bem resumida da história – resumir 1039 páginas faria com que spoilers fossem dados e essa não é a intenção do texto; algumas curiosidades da história e, porque esse livro, pra mim, é considerado como o livro da minha vida. Vamos lá!



Sobre a sociedade japonesa – um leve resumo.



A sociedade, de modo estrutural é rígida. Se você nascesse naquela época como Samurai, morreria como um – a não ser que agisse com desonra. Se isso ocorresse, ou cometeria seppuku ou fugiria e viveria como um ronin -, do mesmo jeito se nascesse camponês, teria deveres e pagaria imposto ao seu suserano e não havia quase nenhum jeito de mudar seu status social, exceto se o Daimio (senhor da terra), quisesse. Ou seja, nessa estrutura social, em formato de pirâmide, havia o Imperador, que era escolhido por Deus e, portanto, intocado e Senhor do Japão (primeiro nível = topo), os Daimios e seus representantes (segundo nível), que eram espalhados pelas grandes cidades e cuidavam das provincias recolhendo impostos e treinando guerreiros, e os camponeses (terceiro nível – base da pirâmide). As mulheres não tinham papel representativo na sociedade, dependendo apenas do papel do marido na sociedade. Eram submissas ao marido, mas também possuíam responsabilidade referente a economia doméstica, sendo responsáveis pela prosperidade – ou ua (harmonia) – do lar, enquanto os homens cuidavam da política e de planejamento para guerra – se fossem Samurais, ou trabalhavam no campo, se fossem camponeses.

O conceito sexual a respeito dos japoneses daquela época era considerado como uma atividade diária, comum e cotidiana. Afinal, o verdadeiro amor não vinha apenas do “travesseiro” (gíria utilizada por muitas vezes no livro), mas de se entregar de alma para uma pessoa. Parafraseando o próprio livro “Não temos palavra para o amor do modo como compreendo o significado dela. Dever, lealdade, honra, respeito, desejo, essas palavras e pensamento são tudo o que temos e necessitamos.” (p. 311 – linhas 2 a 4). Tal fato assombra o personagem principal, já que o livro se passa num momento histórico em que a igreja tem um controle sobre a população européia. E o conceito de sexo ser uma coisa comum era, e ainda é, algo abominado por parte da igreja.

A trama de Xogum

Dado mais ou menos essa aula de história básica sobre o século XVII no Japão, o livro conta a história de John Blackthorne, que, através de um portulano (guia de navegação) roubado
comprado de um navegador português, resolve desafiar e percorrer o novo caminho descoberto para as Índias, mas, devido ao naufrágio de sua nau capitânia – Erasmus – acaba parando na aldeia de Anjiro, província de Izu, no Japão, e lá, é capturado pelo Daimio da província – Kasigi Yabu (um dos seres mais odiáveis que já cruzou essa terra), e Blackthorne precisa aprender rapidamente a língua e os costumes daquele povo, antes que ele seja morto pela espada.

Do outro lado, temos um Imperador que tem 05 anos, portanto, não possui idade para assumir o poder com a sabedoria que o “cargo” lhe dispõe e nem tal legitimidade - essa somente após seus 17 anos, conforme desejo de seu pai - sendo assim, o poder está na mão do conselho de Daimios, formado por 05 Daimios diferentes. Tudo "ia bem" até que um dos Daimios morre de um “mal súbito” - popularmente conhecida como “morte morrida”.
Esse evento específico causa o começo de um atrito entre dois Daimios – de um lado temos o conselheiro Yoshi-noh-Toranaga, dono do Kwanto (engloba Tóquio, Saitama e outras províncias) e das oito províncias que não são descritas no livro, que é um general vitorioso que não sofreu nenhuma derrota, nem mesmo para o invicto estrategista Nakamura, e alguns querem que, mediante o Xogunato, que o mesmo controle o país até o imperador atingir 17 anos – considerado maioridade e, do outro lado, temos o Daimio Ishido – detentor de Osaka, a fortaleza impenetrável. Ishido luta pela manutenção do poder por parte do Imperador, mas possui intenções obscuras que eu não vou falar e, por enquanto, os outros dois Daimios que são inimigos entre eles (Onoshi e Kiyama) não possuem lados, ou seja, são fiéis da balança.

Um outro fator que influencia a trama, é o fato dos portugueses - que estavam em guerra contra os ingleses e os neerlandeses (holandeses), é a religião, já que os dois daimios inimigos só não se atacam porque são cristãos e, de certa maneira, "controlados" pelos portugueses.

A chegada de um estrangeiro pode virar a maré de como os japoneses conhecem os estrangeiros, suas táticas de guerrilha, política e relações comerciais. E, com isso, o estrangeiro acaba virando um diferencial da Guerra Civil que pode estourar a qualquer momento. E através desses dois entreveros, a trama da história gira com vários personagens e situações engraçadas e embaraçosas que o personagem principal passa, até se acostumar e se adaptar aquele povo cheio de mistérios.


Curiosidades sobre XOGUM:

  • Embora os nomes dos personagens sejam fictícios, o mesmo foi inspirado no começo do chamado “período Tokugawa”, ou Xogunato – mais informações aqui;
  • O filme “O grande Samurai” ocorre logo após o período Tokugawa, mais precisamente entre esse período de ouro dos Samurais e o período/era Meiji - fim dos samurais e inicio das parceirias comerciais japonesas - abertura dos portos;
  • Houve uma série em 1980 que retrata os acontecimentos do livro, com 10 episódios que foram transmitidos pela emissora de TV por assinatura TCM; 
  • É possível traçar um paralelo sobre o período histórico do livro e os acontecimentos referentes a “reforma protestante”, com direito a alguns personagens históricos;
Trailer da série Shogun, baseado no livro homônimo

O livro da minha vida:

Acho que essa parte do texto vai ficar meio pessoal demais, mas, como me disseram uma vez, “se você chama esse livro de livro da sua vida, ele merece, no mínimo, respeito.”

Xogum possui esse titulo, porque, embora tenha uma “biblioteca” vasta e muitas histórias excelentes passaram pela minha vida e deixaram a sua marca, esse livro fez com que eu conhecesse o que é o caminho do Samurai (bushidô) e a grande importância que ele tem na minha vida desde então.

Claro que não é possível utilizar esse credo completamente no dia a dia - e eu não gostaria de ter que cortar a cabeça de algúem por qualquer coisa-, mas do mesmo jeito que as religiões são formadas de vários dogmas de ação referente a bondade e retidão do ser humano, o bushidô também pode sofrer essa, vamos chamar de adaptação.

Esse livro, fez com que eu desse uma guinada na minha vida, referente ao fato de ter um sonho de aprender a língua japonesa e começasse a aprender japonês – não vou dar link da escola sem patrocínio ou diminuição das mensalidades em um lugar que, em quatro meses já deu uma boa base. Enfim, esse livro mudou minha vida e me deu mais um sonho possível a perseguir.

E aí, existe algum livro que te impulsionou a realizar algo importante para você? Algum livro que te inspirou a mudar, não só a sua vida, mas ajudar a mudar a de alguém?

Um comentário:

  1. Que legal descobrir que esse livro também mudou a vida de outra pessoa (eu também iniciei meu sonho de aprender japonês após acabar de ler)
    E se eu tivesse mais tempo hoje em dia leria Shogun novamente. O autor faz a história se mover como um jogo de xadrez, onde cada personagem é uma peça fundamental para o xeque-mate que é o final. Eu amei ele inteiro, engoli as 1000 e tantas páginas em menos de dois meses (embora as primeira 50 páginas eu tenha achado meio parado o ritmo). Clavell deve ter sido japones em outra vida, nada explica sua sensibilidade oriental aguçada haha. Recomendo ler o resto da saga oriental, especialmente o livro GaiJin que trata do fim do xogunato, e apesar de ser menos legal que shogun, é também bem interessante, por mostrar um japão antigo e moderno se mesclando.

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